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OPINIÃO: A como fator de longevidade

Uma escola pré-teológica gaúcha, fundada há 92 anos e cujas portas se fecharam há 35, continua a congregar ex-alunos de forma sistemática e prazerosa. 

 

Com padrões elevados de ensino, encaminhou-os para diversas áreas profissionais, pois, além de pastores de confissão luterana, há advogados, tradutores, professores, músicos, artistas plásticos, médicos, diretores de escolas ou de empresas e até um premiado cineasta.

A associação de ex-alunos existe há 64 anos e recebe contribuições monetárias, inclusive de colegas do exterior. Parte da verba é usada para imprimir um informativo duas vezes ao ano e outra é destinada à manutenção de bolsas a alunos da faculdade de teologia, da qual muitos fizeram parte. Outra obra monumental é a restauração de sua querida escola, que já foi tombada pelo Patrimônio Histórico do Rio Grande do Sul.

Até hoje, com idades que variam de 55 a 94 anos, trocam telefonemas e e-mails com frequência. Também um pequeno grupo é destacado, anualmente, para organizar e promover um encontro de dois dias, sempre por volta do feriado de 21 de abril, quando cerca de 60 pessoas acorrem dos mais longínquos recantos do Brasil e até do exterior para um final de semana com colegas, que, por vezes, não são vistos por décadas.

Nessa ocasião, assistem a recitais e encenam peças teatrais que foram apresentadas em sua infância, sendo Fausto, de Goethe, a escolhida em 2009. Também participam de debates atuais, como De onde virá o nosso pão? ou Meteorologia, uma discussão sobre o aquecimento global.  Em abril de 2013, um coral formado por colegas que há 50 anos não se viam, fez uma apresentação para relembrar a gravação de um disco daquela época. Foi memorável.

O culto dominical é transmitido da igreja, via internet, para que todos que não puderam comparecer, possam rever seus queridos colegas.

Para essa gente, não há tempo de pensar em envelhecer. Eles querem viver e sabem como!

Eles mantêm o brilho da juventude em seus olhos enquanto pensam em como viajar para visitar um ex-colega que hoje mora na Suíça, em São Paulo, na Alemanha, no Espírito Santo ou no Canadá.

Por que não se acomodam? O que faz com que essas pessoas, após tantos anos, continuem a nutrir respeito e amor a uma instituição de ensino - que costumeiramente é tida como algo distante e que não vale a recordação?

O que move esse grupo específico? O que faz com que levantem a cada dia com novas idéias e novos projetos, não se preocupando se já passaram dos 60, 70, 80, 90 anos? É uma juventude de cabelos brancos e de caminhar lento, mas firme em direção aos seus objetivos, sempre tendo em vista a fé, a caridade para com o próximo, à família e aos amigos.

Destacando um desses alunos, que hoje está com 90 anos, é possível ter uma visão global do modo de pensar e agir de muitos outros. Ele, que transferiu uma escola de cidade, foi seu diretor por 30 anos e, nesse período, fundou um quarteto de cordas, dirigiu um coral e uma orquestra de câmara. Perguntado por que esteve envolvido por mais de cinco décadas com administração, educação e música, respondeu: “Acharam que eu não prestava para outra atividade. Por isso fiquei!”

Há um ano, ele dirigiu por 200 quilômetros para levar um amigo a uma cidade que este gostaria de visitar. E foi o motorista na volta também. A explicação: “Eu adoro dirigir e não sei por quanto tempo mais poderei fazê-lo.” Quando questionado a que atribuía sua longevidade, saiu-se com uma frase que o caracteriza como alguém de bem com a vida: “Devo a minha idade avançada ao fato de ainda não ter morrido!” 

Diversas autoridades médicas enfatizam como fator fundamental para a elaboração do sentido da vida e enfrentamento de dificuldades que as pessoas tenham fé, espiritualidade e uma crença, independente de seguir ou não uma religião.

Esse grupo tem. E é essa mesma fé que os levou, na tenra idade, para um internato, longe de casa, pelas mãos de seus pais, professores e pastores de suas comunidades, que ainda os mantêm e conforta. Não há uma reunião sem que se leia e se discuta alguma passagem bíblica, seguida pelo canto de algum hino de seus livretos de mais de meio século.

Pode-se inferir desses exemplos, no mínimo, que a amizade duradoura, a elaboração de projetos, a constante atualização sobre tudo o que acontece ao redor e, principalmente, a espiritualidade, é que devem gerar o “moto perpétuo” que dá ânimo e vitalidade a essa turma incrível.

Hoje, a realidade nos mostra os vovôs - e mais acentuadamente as vovós - com projetos, sonhos e ideias que por vezes superam as dos mais jovens. 

As pessoas em geral pensam numa perspectiva curta demais: a balada no fim de semana, o almoço de domingo, o carro novo e o futebol. Já os idosos fazem planos e reservam passagens para viajar daqui a um ano e para o mais longe possível. 

É preciso olhar com mais atenção e envolver-se com as gerações passadas, pois os jovens não querem e nem fazem ideia da bagagem de conhecimento que podem adquirir com o simples convívio. Participar de uma palestra, um bailinho, uma caminhada ou uma aula de ginástica e, mais ainda, visitar um lar de idosos, conversar e trocar experiências, certamente trará novo horizonte e, o deles, não mais será sombrio e incerto, mas terá as fantásticas cores do arco-íris.

O benefício é mútuo e a educação que hoje se dá aos nossos filhos terá outro enfoque.

 

Gilberto R. Winter